Guilherme Pin – Oficina Geek

Ari Aster, apesar de um nome recente no meio dos holofotes, já conseguiu deixar uma marca significante nos últimos anos. Depois de apresentar Hereditário no ano passado, o americano retorna ainda mais bizarro, chocante, provocador, mas principalmente, interessante. Ainda que Midsommar e Hereditário sejam filmes diferentes, são também muito parecidos. Não só pela qualidade técnica de Aster em conduzir uma história com um roteiro pesado – e ao mesmo tempo simples – como os dois trazem uma poderosa temática em suas entrelinhas.

Enquanto na obra estrelada por Toni Collette, o espectador é levado para uma jornada religiosa e mística diante de “maldições” transmitidas hereditariamente, Midsommar é, por si só, algo ainda mais mundano do que aparenta. Será comum ver espectadores saindo de sessões com seus celulares em mãos para pesquisar a misteriosa cultura sueca a procura de respostas sobre a intenção do cineasta diante tantas coisas exibidas em tela.

No entanto, o poder narrativo de Aster está em justamente brincar com as expectativas e conseguir, com isso, fazer o oposto de seu filme anterior. Enquanto um é trabalhado basicamente em uma fotografia escura, explorando a noite como uma aliada, aqui, a luz toma conta, fazendo até uma certa brincadeira com o próprio gênero. Em Hereditário, as pistas para a conclusão são dadas através de detalhes únicos. Já Midsommar entrega suas conclusões diretamente. Por sua vez, os dois filmes tem algo a dizer que vai além da tela.

Aqui, ainda que expositivo, Aster consegue manter o espectador preso diante uma realidade estranhamente bizarra que transmite a curiosidade necessária para manter o interesse. Sua profundidade caminha junto, mantendo o mesmo interesse ao trabalhar com temas curiosamente mais mundanos, como a dor de uma perda e o desejo pelo pertencimento.

Com um espírito que muito remete ao David Lynch de Twin Peaks, a bizarrice é o prato cheio de Aster, e se a de Hereditário surpreendeu, a de Midsommar é de chocar. Muito vem pelo fato não só do diretor entregar cenas com violência explícita – beirando ao gore – como trabalha cenas incômodas que irá gerar as mais diversas reações no público. Mas ao todo, o foco real está em sua história, e como o mesmo a trabalha com esmero. Até quando explícito, Aster é cuidadoso e transporta o espectador para um universo único de loucura, mas também com muita humanidade.

Aparentemente distante, a narrativa do cineasta trata de conflitos humanos tão mais aterrorizantes que espíritos malignos. A dor de um coração partido ou a sensação de isolamento são batalhas internas assustadoras, e Aster as explora com suas melhores ferramentas. Isso transforma Midsommar não só uma obra completa tecnicamente, como também incomoda da maneira mais gratificante possível, transformando o bizarro de um universo medonho em uma reflexão sobre nossos próprios monstros internos e nossos medos sociais.

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