Gás Verde inaugura usina de biogás no Rio

NICOLA PAMPLONA
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A contratação obrigatória de térmicas incluída pela Câmara dos Deputados na MP (medida provisória) de privatização da Eletrobras gerou um embate entre empresas do setor de energia e as distribuidoras de gás canalizado e deve virar alvo de uma batalha no Senado.


A contratação das térmicas foi incluída na MP pelo relator do projeto no Câmara, o deputado Elmar Nascimento (DEM-BA). O texto aprovado prevê a compra de 6.000 MW (megawatts) de usinas que devem ser instaladas nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste.


Essa imposição muda a lógica do setor. Atualmente, a compra de energia pelas distribuidoras de eletricidade se dá por meio de leilões do governo em que as diversas fontes de geração disputam os contratos. Ganham os projetos que apresentarem a menor tarifa, independentemente do local onde serão instalados.


Caso a MP seja aprovada no Senado, a expectativa é que o governo realize leilões específicos para a contratação dessas térmicas, com definição dos locais onde as usinas ficarão.


Os críticos dizem que essas térmicas não passariam de “jabutis”, nome dado a medidas que são incluídas em projetos de lei durante sua tramitação, mas que não têm nenhuma relação relevante com a proposta original da matéria -no caso, a privatização da Eletrobras. Defendem que sejam retiradas do projeto no Senado.


Eles afirmam, ainda, que, se o projeto for aprovado como está, vai criar uma reserva de mercado para atender interesses privados no setor de gás ao custo de aumento na conta de luz de todos os brasileiros. O principal beneficiado seria o empresário Carlos Suarez, da Termogás.


A Termogás é sócia de distribuidoras de gás canalizado ainda não atendidas por gasodutos, como a do Distrito Federal e a do Maranhão.


O texto não especifica em que estados as térmicas serão construídas, mas indica, por exemplo, que o Piauí, onde a Termogás também está presente, terá uma usina. A ideia seria viabilizar um gasoduto até a capital Teresina, única do Nordeste longe da costa.


Para justificar a construção dos gasodutos, as térmicas terão de operar com maior frequência do que o modelo atual, que prevê o acionamento dessas usinas apenas quando as fontes mais baratas não dão conta de suprir toda a demanda.


Dessa maneira, essas novas térmicas vão operar de forma ininterrupta, com um fator de capacidade superior a 70%. A demanda por gás viabilizaria a construção de gasodutos para o interior do país -hoje, a malha é concentrada perto do litoral.


Para grandes consumidores e comercializadoras de energia, os principais opositores, esse modelo limita a competição e vai demandar investimentos bilionários em gasodutos para atender as essas novas térmicas, que estão distantes da infraestrutura atual de transporte do combustível.


“A gente defende lógica econômica”, diz o presidente da Abraceel (Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia Elétrica), Reginaldo Medeiros. “Sempre precisa construir a usina mais barata para o consumidor.”
As distribuidoras de gás, por outro lado, defendem que essas térmicas contribuiriam para reduzir as tarifas, porque esses projetos substituirão usinas a diesel ou óleo combustível, mais caras, e evitam a construção de linhas de transmissão levar energia do litoral ao interior.


Também argumentam que os opositores estão mais preocupados com a possibilidade de queda nos lucros que têm com a comercialização de contratos de energia no chamado mercado livre (no qual os valores da energia são negociados entre as partes), já que a oferta permanente da energia das térmicas criaria um ambiente com preços mais estáveis.


O presidente da entidade, Augusto Salomon, diz que o custo dos gasodutos não é problema, já que o investimento seria ancorado pela demanda da térmica. E defende que, com um volume adicional de energia firme, o país conseguirá preservar os reservatórios, reduzindo o risco de apagões.


Não é de hoje que a discussão sobre essas térmicas a gás alimenta debates.


Em 2018, no fim do governo Michel Temer, os leilões regionais dessas térmicas a gás geraram polêmica semelhante. A proposta chegou a ser oficializada pelo então ministro de Minas e Energia, Moreira Franco, em setembro, pouco antes da eleição. No entanto, a ideia não evoluiu.


A Abegás tentou incluir o tema também no debate sobre o novo marco regulatório do gás natural, aprovado no Congresso em março, mas foi vencida. Em outro projeto, sobre risco hidrológico do setor elétrico, a entidade tentou criar um fundo com recursos do pré-sal para subsidiar gasodutos.


A proposta é vista com desconfiança também entre outros especialistas do setor não ligados formalmente a nenhuma entidade de consumidores ou indústrias.


“No fundo, é um movimento de gente que tem interesse”, diz a economista Elena Landau. “Mesmo que as térmicas sejam importantes, [a decisão] tem que partir da EPE [Empresa de Planejamento Energético], que é a empresa responsável pelo planejamento.”


Landau é uma conhecida defensora de privatizações. Esteve à frente do Programa Nacional de Desestatização durante o governo FHC. No entanto, diz que já não gostava do projeto proposto pelo governo e, com as mudanças e a falta de debates, é hoje contrária à privatização.


Por outro lado, o texto aprovado na Câmara recebeu nesta semana apoio em reunião de diretores da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). Para Sandoval Feitosa, a contratação das térmicas ajuda a levar para o interior do país gás natural que hoje está sendo reinjetado nos poços por falta de capacidade de transporte.


O texto vai agora ao Senado, onde seus opositores esperam derrubar os jabutis incluídos na Câmara, entre eles a questão das térmicas.


Procurados, o deputado Nascimento e o empresário Suarez não responderam ao pedido de entrevista.

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