Nascido em Jundiaí, Mateus Alves Pereira veio morar em Rio Claro quando tinha quatro anos. Hoje, com 30, se considera um rio-clarense de coração e foi na cidade que descobriu uma arte que transformou a vida. O morador do bairro Mãe Preta é um artista urbano e tem como tela os muros realizando o grafitti. Ao Jornal Cidade ele falou sobre o trabalho, luta, preconceitos, valores e ensinamentos; confira.
JC: Quando começou a sua paixão pela arte?
Mateus: “Desde criança o desenho já era uma ligação forte pra mim. Era o jeito que eu tinha de me expressar, de colocar pra fora o que eu sentia e o que eu via nas ruas. Mas o ponto de virada, o momento que deu um choque em tudo, foi em 2007. Estava rolando uma apresentação de hip-hop na escola, e o graffiti, de repente, cruzou meu caminho. Naquele segundo, eu entendi que o muro podia ser muito mais que concreto, podia ser voz, podia ser mensagem, podia ser transformação. O graffiti, de verdade, me salvou. Me ensinou o valor da disciplina, do respeito e da verdade. Foi ali que eu vi que a arte era, sim, caminho e propósito de vida”.
JC: Quando você decidiu realmente fazer da sua arte uma profissão? Já chegou a ser criticado ou sentiu discriminação?
Mateus: “Sabe, o graffiti nunca foi visto como uma profissão. Ele foi a escola que me deu a base para viver da arte. A rua me deu visão, me deu coragem e me ensinou a transformar essa energia do graffiti em pintura artística. Lógico que no começo enfrentei olhares tortos e muito preconceito. Mas o tempo está aí para provar que a arte de rua também é cultura, é comunicação e é trabalho sério. Hoje, cada mural que eu pinto é uma resposta silenciosa a quem duvidou e, principalmente, uma homenagem à quebrada que me formou e me deu essa identidade”
JC: Sente que é uma arte banalizada ainda ou o pensamento das pessoas têm mudado ao longo do tempo?
Mateus: “O pensamento vem mudando bastante, mas a gente ainda tem um chão para percorrer. Antes, o graffiti era puro e simplesmente visto como vandalismo. Hoje, a gente vê ele ocupando escolas, fechando comércios e ganhando espaço em eventos culturais. A arte urbana está começando a ser reconhecida pelo que ela é: uma expressão legítima, que educa e que transforma. Cada pintura que eu faço é um ato de resistência, um grito de presença, e um convite para as pessoas olharem a rua com outros olhos, com mais respeito”.
JC: Muita gente ainda confunde pichação com grafite, o que é importante entender e se informar?
Mateus: “É simples: a pichação e o graffiti nasceram do mesmo lugar, que é a rua. A pichação é o protesto, é a marca, é a resistência. Já o graffiti é o diálogo, é a cor, é a reconstrução. Não é sobre tentar separar um do outro, é sobre entender o contexto e a raiz. A rua não te ensina a julgar — ela te ensina sobre expressão, liberdade e, acima de tudo, a verdade.”
JC: Hoje você desenvolve um projeto que apresenta o graffiti em escolas, qual a importância disso e qual a recepção dos alunos?
Mateus: “Levar o graffiti para dentro das escolas é levar consciência e oportunidade. A recepção é sempre incrível porque os alunos se identificam, eles enxergam na arte uma linguagem que é próxima da realidade deles. Eles aprendem que a arte também é educação, respeito e que pode gerar oportunidades. Nas oficinas que eu realizo, eu vejo jovens descobrindo talentos que nem sabiam que tinham, aprendendo sobre foco e ganhando autoestima. O graffiti na escola é mais do que só pintar um muro — é uma ferramenta poderosa de transformação social e pessoal”
JC: Você já esteve em outros Estados mostrando o seu trabalho, conte sobre como é expandir e levar conhecimento.
Mateus: “Antes de sair, a gente teve que fortalecer a cena aqui em Rio Claro. Eu participei e ajudei a organizar vários eventos importantes, como o Festival de Graffiti da UNESP – Painel da Inclusão, o Treta do Lago, que celebra os quatro elementos do hip-hop, e a exposição no Centro Cultural Paulo Rodrigues. Além disso, organizo a ‘Sopa de Letras’, aqui na cidade, um evento que reúne a galera da cidade e região e de outros estados. Esses encontros são a base do meu crescimento. Depois dessa caminhada, recentemente tive a honra de representar meu trabalho fora, participando do Encontro de Arte Urbana em Juiz de Fora (MG). Levar o nome da minha cidade e, principalmente, do meu bairro Mãe Preta para outro estado foi um dos momentos mais marcantes”.
JC: Quem quer começar no graffiti ou ingressar no mercado de trabalho qual o seu conselho?
Mateus: “O conselho é o básico que funciona: tem que desenhar muito, estudar muito também e, principalmente, pintar sem medo. Viva a rua, respeite a rua, e passe sempre a verdade no que você faz. O graffiti não é sobre a fama, é sobre a vivência, a entrega e a sua identidade”
CONHEÇA MAIS
Para acompanhar os murais, os projetos sociais nas escolas e ver como a arte que nasce na rua tem o poder de educar, inspirar e, acima de tudo, salvar vidas, o Instagram é @mateus_artzs. Mais informações sobre encontro em escolas e outros projetos os interessados podem entrar em contato através do Whatsapp: (19) 97130-7657.