LAURA MATTOS – SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

A dois meses das eleições municipais, prefeitos do estado São Paulo têm se pautado em pesquisas de opinião pública e em cálculos políticos para decidir quando devem reabrir as escolas. Como a maioria dos pais se mostra insegura e os sindicatos dos professores pressionam pelo adiamento, prefeituras estão postergando a decisão, apesar de o governo estadual de João Doria considerar segura a volta gradual a partir do dia 8.

Até terça (1º), a uma semana da data do retorno opcional para recuperação e atividades de acolhimento, 128 dos 645 municípios paulistas haviam confirmado ao governo que iriam liberar a volta. Destes, apenas cinco já tinham publicado decreto (Itu, Sorocaba, Itapevi, Ribeirão Preto e Cotia).

Dúvidas em relação à contenção da pandemia e dificuldades financeiras para o preparo das escolas são colocadas como motivos do adiamento. Mas o cálculo político é admitido informalmente por candidatos à reeleição e assessores.

A maior parte das cidades elabora pesquisas com os pais, e não raramente definem assim o retorno. Em casos como da região metropolitana de Campinas, os prefeitos deixarão para os pais a decisão sobre a retomada, com enquetes feitas pela internet.

Na capital, o prefeito Bruno Covas, que seguiu a maior parte do Plano SP, no caso da educação foi mais restritivo, alinhando-se ao temor do eleitorado -uma pesquisa da prefeitura mostrou 80% dos pais contrários à volta. Após adiar o retorno parcial em setembro e colocar o de outubro em dúvida, já cogita deixar para 2021.

Esse desalinhamento de Covas com Doria, seu correligionário no PSDB, tem causado estresse nos bastidores. Não reabrir, afinal, é não endossar a análise do centro de contingência do coronavírus, tratado como “dream team” pelo governador nas entrevistas sobre a pandemia e do qual participa Edson Aparecido, secretário de Saúde da capital.

A argumentação da prefeitura tem como base o inquérito sorológico da rede municipal, que indicou que cerca de 20% dos alunos já foram infectados e quase 70% dessas infecções foram assintomáticas. Por isso, diz a prefeitura, haveria o risco de que se tornassem vetores de contaminação.

Mas há diferentes leituras dos resultados pela prefeitura e pelo estado, baseadas em pesquisas contraditórias sobre riscos de que crianças disseminem o vírus.

No centro de contingência, prevalece a interpretação de que os dados do inquérito sorológico não seriam impeditivos para a volta gradual proposta no Plano SP, com até 35% dos estudantes nas escolas. Essa visão tem sido discutida com a equipe de Covas, a fim de alinhar uma posição que não soe como contradição.

A defesa da reabertura tem sido contundente pelo secretário de Educação de Doria, Rossieli Soares.

No início desta semana, ele afirmou que “não podemos misturar as eleições municipais com essa decisão tão importante”. Nesta quarta (2), na entrevista à imprensa com o governador, aproveitou a campanha de setembro amarelo, de prevenção ao suicídio, para abordar impactos emocionais do confinamento.

Paira ainda sobre a decisão a mudança da capital para a fase verde do Plano SP, que, se não for confirmada na reclassificação desta sexta (5), muito provavelmente o será na seguinte, dia 19. É a penúltima das cinco etapas, que pressupõe alto grau de controle da pandemia e libera praticamente todas as atividades.

No governo e na prefeitura, há quem defenda que soa incoerente apenas a educação não voltar quando shoppings já estão lotados. Covas avalia se, ainda assim, manterá o discurso de que o fechamento das escolas é necessário para o controle da pandemia.

A sensação de contrassenso entre escolas fechadas e o clima de retomada chegou a grupos de WhatsApp de pais, que até então compartilhavam majoritariamente conteúdos contrários à volta. Após o fim de semana com praias cheias, circulou meme com foto de banhistas aglomerados e o diálogo de uma família entre guarda-sóis: “Mãe, eu vou para a escola amanhã?”; “Não, filho, não é seguro”.

Um integrante da equipe de Covas disse à Folha de S.Paulo que a batalha maior para a retomada da educação presencial não é mais a do controle à pandemia, mas a da comunicação. Seria preciso reconquistar a confiança dos pais e dos professores, após cinco meses dizendo para todos ficarem em casa.

Ainda que a capital caminhe para o controle, a população acompanha nos noticiários o número elevado de mortes no país. Para esse analista, os políticos não gozam de credibilidade para o resgate da sensação de segurança, e essa bandeira teria que ser levantada pela própria sociedade civil.

Instituições da área já começam a se manifestar, ainda que evitem citar datas.

Denis Mizne, diretor-executivo da Fundação Lemann, afirma ser importante a noção de que não se pode esperar o risco zero. Para ele, deve-se considerar os riscos de manter as escolas fechadas mais do que o necessário, como o de evasão e o da saúde mental das crianças.

Heloísa Morel, diretora-executiva do Instituto Península, que desenvolve projetos para a melhoria da educação voltados para os professores, afirma que é preciso resgatar a confiança dos educadores. Uma pesquisa realizada de 20 de julho a 14 de agosto com 3.800 professores do país aponta que o nível de conforto em relação à retomada presencial, entre 0 para “nada confortável” e 5 para “muito confortável”, está em 1,07.

“Além do medo da contaminação, há dúvidas sobre as mudanças de currículo para a recuperação e sobre o papel deles nos protocolos de segurança. É preciso um trabalho de comunicação e de acolhimento com os educadores para reduzir essa ansiedade.”

Covas tem sido alertado que, até a hora da urna, com a pandemia provavelmente mais controlada, é possível que os pais estejam mais sensibilizados para os impactos do confinamento e que considerem a dificuldade de trabalhar sem ter onde deixar os filhos.

Mesmo prefeituras que já publicaram decretos liberando a volta são criticadas porque o aval foi dado apenas a estaduais e particulares, não para municipais. Em Ribeirão Preto, opositores do prefeito Duarte Nogueira (PSDB) relacionam a decisão ao período eleitoral, o que a prefeitura nega.

Ex-governador de São Paulo e pré-candidato à prefeitura da capital, Márcio França (PSB) afirmou à Folha que o adiamento por Covas mostra “falta de apetite para resolver as coisas”. “Se a prefeitura tivesse preparado as escolas, os pais e os professores estariam mais seguros, e poderia haver a volta gradual.”

Secretário municipal de Educação de São Paulo, Bruno Caetano diz que as escolas estão, sim, preparadas para o retorno em outubro, se a volta for considerada segura. “Contratamos 2.000 educadores para substituir os que estão em grupos de risco. Já temos todos os EPIs [equipamentos de proteção individual] e estamos treinando as equipes para seguir os protocolos”.

Edson Aparecido, secretário de Saúde da capital, disse que a educação se diferencia de outros setores porque as escolas envolvem maior circulação de pessoas, além do fato de as crianças assintomáticas poderem ser transmissoras.

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