WESLEY FARAÓ KLIMPEL SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As festas de fim de ano, para muita gente, são ocasião para uma boa reunião familiar. O que pode ser sinônimo de momentos harmoniosos, ou então de debates acalorados sobre qualquer coisa: governo Bolsonaro, vacina contra Covid ou uva passa na comida, sempre é possível falar sobre tudo isso na mesma noite e ainda deixar espaço para a piada do pavê na sobremesa.

Com a variante ômicron e a gripe se espalhando mais depressa que o espírito natalino, muita gente pode querer retomar a hashtag “fique em casa”. Aliás, como mostrou o Datafolha, a maioria dos brasileiros diz que deve evitar viajar e se reunir com pessoas de fora de casa nas festas de fim de ano. São 62% os que declaram pretender se encontrar apenas com moradores do próprio domicílio no Natal e no Réveillon.

Para os outros 38% que vão se expor ao risco de trocadilhos infames e discussões indesejadas, a dica é: “Isso deve ser aceito de forma natural, sem que seja um motivo de conflito. Cada um tem que se sentir à vontade para agir da forma que fique mais confortável”, diz a psicóloga Vanessa Gebrim.

O problema para muitos é a pressão social de estar junto da família, mas esse cenário nem sempre é bom para a pessoa, afirma o psiquiatra Jorge Silveira. “Tudo bem você não ir, se você acha que é um período em que passa melhor sozinho ou com um núcleo familiar mais íntimo.” Ele lembra, no entanto, que a decisão trará consequências e que é importante avaliar prós e contras.

Como várias famílias perderam alguém para a Covid, é natural que as pessoas prefiram ficar afastadas -ainda mais que muitos não tiveram a chance de passar por rituais como velório ou funeral. Para Silveira, se você se sente acolhido no leito familiar, vale a pena o esforço de estar lá.

“É um momento em que você compartilha experiências, revivencia um pouco da sua dor, torna ela compartilhada, e isso por muitas vezes pode ajudar no processo de caminhar nas fases de evolução de um luto.”

Por ser o segundo Natal da pandemia, é capaz de você não ter se reunido no fim de 2020 com os parentes. Como saudades combina mais com esquecimento do que farofa com uva passa (olha a polêmica), as brigas e tensões do último encontro familiar, há dois anos, já foram soterradas com tanta notícia ruim da Covid.

Para Christian Dunker, psicanalista e professor do Instituto de Psicologia da USP, é importante não se esquecer completamente de como foi a última vez em que houve uma confraternização com os parentes, porque os mesmos defeitos e a voz crítica de alguns ainda estarão presentes.

“O lado bom disso é que até mesmo esses infortúnios repetidos ao longo do tempo vão formando uma espécie de memória, que vai desde a infância até a adolescência, que às vezes chega na vida adulta. No fundo, essas desavenças vão fazer parte das conversas já esperadas para o Natal.” Como dizem, quem bate esquece, mas quem apanha sempre lembra.

Além do Papai Noel, outros personagens característicos podem dar as caras na mesa do jantar, como o tio do pavê, o primo inconsequente, o avô reacionário ou o sobrinho revolucionário. “É importante já ir prevenido e, de preferência, neutralizar com humor, às vezes adiantando um pouco o tema”, sugere Dunker. Como, doutor? “Eu sei que vão brigar, então está proibido [falar sobre] Bolsonaro antes do peru. Só depois do peru.”

Outra saída é adiantar o futuro do Brasil para o presente e dar a desculpa de que não se pode falar sobre certos assuntos na frente das crianças. Mesmo que elas possam ter mais argumentos que muitos adultos. Truques como fingir uma ligação ou dar atenção para o pet da casa são bastante manjados, mas ainda assim podem ajudar. Também é possível acertar previamente um sinal com algum parente mais próximo, para retomar “aquele assunto” e sair de perto de quem o incomoda.

Vale ter em mente que a quantidade de álcool no sangue é proporcional ao nível de declarações polêmicas e ou de lágrimas derramadas. Independentemente da polarização política e dos temas relacionados à pandemia, há certos atritos que sempre estarão presentes. “Os conflitos familiares vão continuar a aparecer como sempre, como a nora com a sogra ou a mãe com a filha. É difícil ser muito diferente do que já é”, diz a psicóloga e psicanalista Amanda Vargas.

Como estamos no momento de planos para o próximo ano, que tal já começar o projeto Natal 2022? São 12 meses para o próximo encontro familiar, e até lá muitas sessões de terapia podem trazer mais efeito para você do que séries de abdominais na academia. Apesar das tensões natalinas, Vargas deixa uma mensagem positiva. “As famílias sobreviverão. Elas sobrevivem desde que o mundo é mundo.” Ou, como diria Dudu Nobre, “brigam por qualquer razão, mas acabam pedindo perdão”.

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