Vivian Guilherme

A cidade de Baltimore, a apenas 60 quilômetros da capital Washington, enfrenta uma grande comoção pública. As manifestações tiveram início depois da morte de um jovem negro, que havia sido preso pela polícia local. A população saiu às ruas diariamente desde 19 de abril e o governo decretou nessa semana um toque de recolher, após uma série de atos violentos que afetaram a cidade na última segunda-feira (27), em meio aos protestos depois do funeral do jovem negro Freddie Gray, de 25 anos.

As manifestações foram ampliadas nessa quarta (29) e quinta-feira (30), acontecendo também em Nova Iorque, Boston, Washington, Houston, Denver, Seattle, Filadélfia e Cincinnati. A assessora de integração racial de Rio Claro, Kizie de Paula Aguiar, analisa a situação dos Estados Unidos. “Vejo que lá a população não fica apenas indignada, há uma reação para atos de violência contra a vida de jovens negros. É preciso não se acomodar com tantas mortes”, aponta.

Segundo ela, no Brasil “passamos por problemas sérios de genocídio da juventude negra, e o que fazemos?”, indaga. “Muitos acham normal a polícia matar porque estava envolvido no crime; este é o papel da polícia? Por que temos poder judiciário? Deve haver reação popular, mas claro sem violência. O sangue é quente e uma vida vale muito independente das circunstâncias. Talvez por isso os jovens negros de Baltimore reagiram desta forma, uma vida vale muito!”, exclama Kizie.

A socióloga rio-clarense Maria Carolina de Camargo Schlittler, que desenvolveu uma série de estudos sobre o tema, comenta que a prática, de a polícia ter negros como alvo preferencial, é chamada de filtragem racial na seleção policial de suspeitos criminais ou ‘seletividade’ do sistema de justiça criminal e segurança pública. “Estes inúmeros casos de mortes de negros por policiais em abordagens nos EUA é algo que os jovens negros das periferias brasileiras bem conhecem. Só no Estado de São Paulo são mortos duas vezes mais negros do que brancos pelas polícias”, comenta a pesquisadora.

Maria Carolina destaca que: “não é que aqui no Brasil os movimentos sociais não fazem barulho sobre as mortes, eles até fazem, a questão é outra”, afirma. “As mortes de negros por policiais no Brasil está naturalizada, ninguém problematiza porque ela virou sinônimo de ‘fazer segurança pública’. Não se concebe fazer o policiamento sem o uso restrito da força e da letalidade policial. A polícia mata pessoas e a população entende isto como uma faceta do ‘controle do crime’, só que é um engano, pois as pessoas mortas pelos policiais nas ruas nem entram no sistema de justiça criminal, ou seja, nunca se comprovará se elas estavam de fato cometendo alguma ilicitude na hora que foram executadas pela polícia e, mesmo se assim fosse, no Brasil não existe pena de morte, nada justifica a execução que as polícias cometem nas ruas”, esclarece.

Pesquisa desenvolvida por Maria Carolina em 2014, com dados da SSP, mostram que os negros são a maioria das vítimas de mortes praticadas por policiais (61%), especialmente os jovens, já que mais da metade (57%) das vítimas tinha menos de 24 anos na data de sua execução. As vítimas são homens na quase totalidade.

VIOLÊNCIA A NEGROS EM RIO CLARO

Caso bastante icônico aconteceu em Rio Claro em 2013, quando o guardador de carros Benedito Santana de Oliveira foi agredido por dois jovens e veio a falecer logo depois, em decorrência de uma série de complicações. O caso repercutiu bastante entre a comunidade negra de Rio Claro e região. O julgamento dos réus ocorreu nessa terça-feira (28) e os agressores Helcio Alves Carvalho e Axel Leonardo Ramos foram condenados por homicídio qualificado por motivo torpe e homicídio duplamente qualificado por motivo torpe e meio cruel, respectivamente. Helcio deve cumprir pena de 14 anos e Axel de 15 anos e dois meses.

Na opinião de Kizie, a expectativa era de que os acusados recebessem a pena máxima para casos de homicídio. “Não fiquei satisfeita com resultado, porque eles pegaram praticamente o mínimo que a lei prevê e sei que serão beneficiados pelas políticas compensatórias, daqui uns três anos estarão soltos. Entretanto, fiquei feliz porque o Dr. Cerri Neto entrou com o pedido para aumentar a pena”, comenta.

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