Não conheço pesquisa que aponte que os jovens estão mais violentos, diz professora

Antonio Archangelo

Em visita ao Brasil para desempenhar atividades acadêmicas junto ao Instituto de Biociências da Unesp de Rio Claro em relação ao desenvolvimento de um projeto com o grupo de pesquisa “Educação, jovens e violência”, a professora da Faculdade de Educação da Universidade de Cambridge, Hilary Cremin, visitou na última semana o Jornal Cidade, junto com a professora do Departamento de Educação da Unesp de Rio Claro, Joyce Adam. Confira a entrevista:

Hilary ao centro ao lado da professora Joyce Adam. Ednéia Silva e Matheus Pezzotti (como intérprete) participaram da entrevista

JC – Como se iniciou o projeto, esta espécie de intercâmbio Brasil/Inglaterra?

Joyce – Em 2014, fizemos um projeto conjunto, e fomos conhecer o trabalho dela. Com a possibilidade de fazer esta parceria. Apresentamos edital para a reitoria da UNESP, que deu recurso para desenvolver o trabalho. Hilary, alunos de doutorados e professores que irão para lá. Em novembro, faremos um seminário em Cambridge, em Liverpool.

JC – A pesquisa acontece em Rio Claro?

Joyce – Estamos fazendo uma pesquisa na Escola Januário Pezzotti, estamos utilizando a metodologia do Visual Voice. E vamos levantar os tipos de conflitos no ambiente escolar e como eles são abordados pelos alunos e pelos professores.

Esta abordagem já existia, Paulo Freire, que também trabalha com imagens. Estamos utilizando o instrumental “I peace”, elaborado.

JC – O que é violência escolar?

Hilary – Esta questão é subjetiva, tem que se trabalhar com estes dados que estamos colhendo. Precisamos saber o que é violência. Ou seja, depende da relação dos alunos com alunos, alunos com professores. Percebe-se que não têm muitos relatos de violência do professor para com o aluno. Juntando todos os aspectos sociais. Muitas vezes, estamos compreendendo a violência, se concentramos na violência que está acontecendo entre alunos com alunos, alunos com professores. Esquecemos da violência de professores com alunos. Um tipo de violência estrutural. Uma discriminação cultural bem forte.

JC – As crianças e os jovens estão mais violentos hoje em dia?

Hilary – Não conheço pesquisas acadêmicas que tenham concluído que as crianças e os jovens estão mais violentos. O que acontece é que a sociedade está mais preocupada. Na Inglaterra, por exemplo, os dados estão mostrando que os crimes violentos entre os jovens estão caindo. Os jovens estão ficando mais tempo em suas casas, por causa do computador. E, muitas vezes, consomem álcool dentro das residências.

JC – Mas muitos autores questionam o papel das redes sociais. O que pensa sobre isso?

Hilary – É uma questão diferente. As ferramentas do bullying, no ambiente virtual, são diferentes, mas o problema continua. É importante que não demonizemos as redes sociais, temos que reconhecer que elas possuem um papel importante de mobilização social.

JC – Em suas pesquisas, existe um conceito de ensinar a mediação como uma forma de resolver conflitos de forma racional. É isso?

Hilary – Hoje estivemos num curso com professoras mediadoras de escolas estaduais. Assim como as escolas estão alfabetizando, estamos precisando alfabetizar a comunidade escolar na questão de resolução de conflitos. É muito importante que as escolas compreendam que abordagem punitiva é importante às vezes. Porém em diferentes tipos de contexto de conflitos é melhor ter uma abordagem da justiça restaurativa. As pessoas mesmas constroem a resolução deste conflito. Em geral, o papel do professor, nestes casos, é identificar qual é o tipo de conflito. Os professores possuem a tendência de aplicar castigos, eles precisam identificar qual ferramenta utilizar para cada contexto.

JC – Existe uma tendência de se aplicar a estratégia de humilhar quando o conflito aparece?

Hilary – Esta estratégia perpetua a violência. Pode parar por um momento e vai explodir em outro momento, em outro lugar. Estamos somente reproduzindo violência. Tenho conhecido professores bem legais no Brasil. Só pelo castigo, só reproduziremos violência.

Redação JC: